Isotopias, heterotopias e utopias em Belo Horizonte
Para construir uma análise do tema proposto, faz-se necessário primeiramente concretizar um conceito sobre os significados de Isotopias, heterotopias e utopias dentro do campo em questão, a saber, a cidade em que vivemos.
Entendida a cidade como um estabelecimento de edificações e usos dentro de um espaço, mesmo que não precisamente delimitado, podemos situar as “topias” no plano material (edificações) e virtual (usos). Isotopia remete-se á semelhança, planificação ou conexão aparente entre a identidade de um ou mais espaços ou a forma de apropriação deles. Opostamente, heterotopia representa a expressão das diferenças, distâncias e particularidades existentes entre as citadas esferas da habitação (edificação e uso). Já utopia, como representante do objeto não existente no plano material, mas somente no conjunto das idéias humanas, conforma-se a partir do desejo de existência física deste espaço imaginário, ou mesmo das possibilidades oferecidas por ele a serem incorporadas no esquema já existente no presente.
Antes também de discutir estes conceitos sobre “topias” na cidade em tela, Belo Horizonte, estudaremos um pouco a história de sua conformação.
Belo Horizonte, a primeira cidade planejada do país, foi inaugurada em 1897, composta por uma arquitetura contemporânea e eclética com relevante influência da “belle epóque” européia.
Contrastando com a solidez natural das montanhas, a rigidez humana dos edifícios instalou-se definitivamente e, em meados da década de 30, foi iniciado o processo de verticalização da cidade. Fato este, juntamente com várias mudanças que sofria a cidade, que desencadeou um acelerado crescimento urbano. Dessa maneira, Belo Horizonte foi aos poucos adquirindo características dignas de uma metrópole, fonte de desenvolvimento e instalação da mão-de-obra humana que alimentava o setor industrial.
Hoje, no séc. XXI, Belo Horizonte ainda se mostra em formação e mutação, ou seja, o que antes era um espaço homogêneo tem se tornado heterogêneo e vice-versa, conforme a necessidade do desenvolvimento da cidade.
Ao sairmos pelas ruas de Belo horizonte, notamos que os espaços se diferem, se sobrepõem ou mesmo simplesmente mudam de perspectiva conforme a interpretação ou a forma que é usada pelo observador.
As ruas e avenidas do centro da cidade podem ser consideradas espaços isotópicos, onde a presença das linhas retas são comumente utilizadas e diferem-se somente pelas suas distâncias. Outros exemplos destes espaços são as estações metroviárias e rodoviárias, que também são espaços basicamente monofuncionais. Em contrapartida, a de se notar as praças e parques da cidade, locais que por suas particularidades são caracterizados como heterotópicos, pois se diferem tanto usualmente quanto visualmente dos outros espaços. Como exemplo a Praça Sete de Setembro, Praça da Liberdade, Parque Municipal, Parque da Gameleira, dentre outros. Há locais que se confundem como os shoppings centers, que podem ser considerados como heterotópicos pela sua distinção perante a cidade, como também isotópicos pelas suas estruturas padronizadas.
Em outros locais ocorre uma mudança momentânea, como a Av. Afonso Pena, que em um dia da semana, domingo, deixa de ser um espaço isotópico para dar lugar a feira de artesanato conhecida como Feira Hyppie, tornando-a assim um espaço heterotópico. Já nos edifícios conhecidos como “Torres Gêmeas”, localizados no bairro Santa Tereza, a mudança foi definitiva. Um par de prédios destinados a serem ocupados de forma lícita logo tornar-se-iam um espaço isotópico, contudo isso não ocorreu. Ainda inacabada, a obra foi ocupada por sem-tetos. Sua fachada em tijolos à vista e a forma como é utilizado contrasta com a região tornando esses monumentos um espaço heterotópico em sua região.
Como espaços utópicos, onde a manifestação do imaginário e da demanda idealizada da população se estabelece, temos como exemplos as paredes grafitadas da cidade, principalmente no centro, e a praça sob o viaduto Santa Tereza, onde é acontece semanalmente o evento de Hip-Hop “Duelo de Mc’s”. No primeiro exemplo, o grafiteiro usa as paredes da cidade como uma galeria artística de acesso aberto ao público urbano, concretizando assim a utopia da popularização e democratização da arte na cidade. No segundo, da mesma forma, um evento realizado na praça, antigamente subutilizada, hoje leva a música a um público que, em sua maioria, não possui condições de ingresso em casas de shows particulares.
A acrescentar, é notável na cidade a presença de espaços neutros, aqueles que quase não reparamos que nos fazemos indiferentes diante deles, como alguns cruzamentos, pontes e passagens, ou seja, caminhos transitórios. Complexo de viadutos da Lagoinha, cruzamentos no centro de Belo Horizonte, dentre outros exemplos.
Portanto, como profissionais de arquitetura e urbanismo, é nosso papel nos qualificarmos de modo que não aprendamos somente a saciar as vaidades da sociedade, mas também as suas necessidades enquanto componentes de um centro urbano em constante crescimento.